Vital Brazil e a autonomia (vital) para a educação


VITAL BRAZIL E A AUTONOMIA (VITAL) PARA A EDUCAÇÃO


Resumo: O presente artigo tem o objetivo de explanar de forma sucinta a biografia de Vital Brazil e relacionar suas contribuições na medicina com a educação brasileira. A educação, conforme é sabido, sofre defasagens consideráveis no cerne de alunos de escolas públicas que almejam adentrar em cursos superiores considerados, ainda hoje, elitistas, tal qual a medicina que nos serve de protagonista neste trabalho. Buscou-se, assim, conjugar a biografia de Vital Brazil com as colocações de Paulo Freire em "Pedagogia do Oprimido" concluindo que a autonomia e a perseverança do educando diante das opressões e obstáculos são de suma importância para a concretização e a construção do indivíduo.

Palavras-chave: Educação brasileira; Pedagogia do oprimido; Vital Brazil

Abstract: This paper its purpose explain a summarized form the  Vital Brazil's biography and relate to their contributions in medicine with the Brazilian education. The education, as is known, suffers considerable gaps at the heart of public school students that aims to enter in university courses considered, even today, such elitists which medicine that serves the protagonist of this paper. It attempted to thus combine the biography of Vital Brazil with the placement of Paulo Freire in "Pedagogy of the Oppressed" concluding that the autonomy and perseverance of the student in front of oppression and obstacles are of paramount importance to the implementation and construction of the individual .

Keywords: Brazilian education; Pedagogy of the oppressed; Vital Brazil


Introdução
"A única felicidade da vida está na consciência de ter realizado algo útil em benefício da comunidade”.
Vital Brazil (1865 – 1950)
.
Imagine se hoje em dia os cartórios permitissem aos pais colocarem o sobrenome que quisessem em seus filhos. Além dos nomes de “moda” como nome de jogadores de futebol, de atrizes ou até mesmo de personagens da Literatura, teríamos alguns sobrenomes inusitados, como por exemplo, “Macabéa da Hora da Estrela” [1]
Lá em meados de 1865 isso era, sim, permitido. Tanto que o Sr José Manuel dos Santos Pereira Junior (1837 – 1931), esposo da Sra Mariana Carolina Pereira de Magalhães (1845-1913) que se casaram em Campanha, Minas Gerais, no ano de em 1860, resolveu dar aos seus oito filhos nomes desvinculados à sua família por oposição ao casamento forçado de sua mãe.
Sr Manoel decidiu, então, homenagear o lugar que cada um dos seus oito filhos nasciam e assim o fez: Vital Brazil Mineiro de Campanha³, Maria Gabriela do Vale do Sapucahy; Iracema Ema do Vale do Sapucahy; Judith Parasita de Caldas; Acácia Sensitiva Indígena de Caldas; Oscar Americano de Caldas; Fileta Camponesa de Caldas e, finalmente, Eunice Peregrina de Caldas.
Dadas as justificativas para a curiosidade de seu nome, vamos discorrer neste texto fatos importantes sobre esse cientista brasileiro, que no sentido pleno de seu nome foi de Vital importância para o Brasil. Estamos falando de um dos mais importantes cientistas brasileiros, sobretudo para a medicina, Vital Brazil Mineiro de Campanha.
Quando nos lembramos de bichos peçonhentos como a cobra, aranha, escorpião, etc, temos em mente a periculosidade de suas peçonhas, mas talvez nos esqueçamos da importância que foi a descoberta do soro antiofídico. E é exatamente por causa dele que Vital Brazil é tão lembrado ainda hoje sendo pioneiro na descoberta de tal soro.

1.    O menino
O interior mineiro foi o cenário para a infância de Vital Brazil[2]. Nascido em 28 de abril de 1865 em Campanha, Minas Gerais, o menino Vital teve uma infância digna de um menino curioso entre as cidades de Campanha e Itajubá.
A maior parte do tempo ficava na fazenda de seu avô onde se produzia de tudo e foi lá que ele teve seus primeiros instintos de pesquisador, ficava horas a fio vendo os escravos trabalharem e observava todos seus detalhes. “Assim aprendeu a fabricar a corda de fumo por meio de cambitos, a fiar o algodão, a tecer, a fabricar a farinha de milho, a moer a cana, a fabricar a cachaça, o melaço e a rapadura.” (BRAZIL, 2000, p.4).
A Vila de Caldas foi o lugar que Vital Brazil atravessou da infância para a adolescência e começou a vivenciar sua formação e intelectualidade. Estudou em escola pública do Professor José Eugênio de Sales, fundador do primeiro jornal de Caldas e por isso era um jornalista muito respeitado.
Dali passou para a escola do Reverendo Miguel Gonçalves Torres, pastor protestante que trazia métodos americanos e o livro de leitura era a História da Bíblia de Barth, de onde tinha belas lições de moral.
Seus estudos se deram em épocas imperiais e escravistas. Do reverendo teve grande influência, não só na sua formação, mas também na família de seus pais que se converteram ao protestantismo em 1878.
Seu pai era um jogador inveterado e assíduo frequentador de mesas de carteado, hábito que o que o fez contrair dívidas que o levou a vender o cartório para pagá-las, e nessa transição, Vital, seus pais e seus irmãos chegaram a São Paulo em 1880, ele então com 15 anos de idade.

2.    O adolescente
Com toda a reviravolta financeira na vida familiar, os homens da família tinham de conseguir emprego para sustentar a casa, assim seu pai conseguiu uma colocação em um serviço de vigilante na escola, mas para o adolescente Vital não restou outra opção a não ser condutor de bonde.
Irrequieto, Sr José Manoel, via no filho a insatisfação e então conseguiu que fosse aceito pela missão protestante no curso para ministro evangélico de onde receberia somente uma pequena ajuda de custo.
Naquela época era costume um estudante que prestava serviços em missões ser incumbido a prestar serviços à missão, e ao jovem Vital restou a incumbência da limpeza das salas e com vassoura em punho varria toda a escola.
Certo de que essa não era sua vocação, decidiu preparar-se para o curso superior e assim procurou pelo Sr Morton na escola em que seu pai era vigilante, propondo-lhe lecionar gratuitamente no curso primário e assim poder frequentar as aulas do curso secundário, e dessa forma seria um professor que aprendia ao mesmo tempo em que ensinava.
Para Freire (2012, p. 75) essa iniciativa chama-se “argumentos de autoridade” em que um educador enquanto educa é educado em diálogo com o educando.
Aos 19 anos, pronto para lecionar, ansiava ir para o Rio de Janeiro onde se encontrava uma das duas escolas de medicina naquela época. A grande, e desagradável, surpresa foi tomar conhecimento de que o acordo não seria cumprido pelo diretor da escola, forçando o jovem rapaz a retornar para sua cidade.
Há um ditado popular que diz: “são os pontapés que levamos da vida que nos empurram para frente”. Faz todo o sentido!
Nessas idas e vindas, ilusões e desilusões, chegou a época de matrícula na universidade. Vital sem dinheiro no bolso, mas apoiado pelo pai que sempre viu no filho a vontade de tornar-se médico, tomou posse das cartas de apresentação feitas por seu pai e saiu em busca de emprego e como nunca foi fácil a busca por emprego, a cada entrega era uma resposta negativa.
Sentiu-se obrigado a ir para o Andaraí e procurar por um ex-deputado e Conselheiro do Império qual entregou-lhe, então, cheio de esperança uma dessas cartas na qual seu pai o descrevia como “moço pobre”. O termo escolhido por seu pai talvez não tivesse sido o adequado e com isso houve uma ação negativa nestas cartas: “moço pobre não estuda, vai empregar-se no comércio, isso de estudar medicina é para quem pode”. E como cada ação tem uma reação, eis o impulso do “pontapé da vida” – “pobre pode e deve estudar, hei de estudar e ser médico”.
A situação em que Vital vivia é muito atual. Quantos jovens que conhecemos levam a mesma vida para poder estudar e ter um futuro melhor?
De tão atual, tomo a liberdade de citar Paulo Freire para dialogarmos a respeito da opressão sofrida por Vital Brazil já naquela época e que ainda hoje é muito recorrente com muitos jovens na mesma situação. Ouçamos Freire:

A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, terá dois momentos distintos. O primeiro em que os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e vão comprometendo-se, na práxis, com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a realidade opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos homens em processo de permanente libertação. (FREIRE, 2012, p.46)

Freire nos mostra que em fases de opressão, não devemos nos condicionar à situação e aceitar como um fato dado da vida. Devemos, sim, nos deparar diante da situação e perceber que a partir do momento que a libertação é possível, ela torna-se iminente.
Vejamos que Vital não era um oprimido, mas sim um homem em processo de libertação a partir do momento em que ele não aceitou a relação dada pelo ex-deputado de que pobre não poderia ser médico.
O jovem rapaz andava a pé para economizar passagem de bonde, tinha tempo de ler somente à noite sob luz de lamparinas e com livros emprestados por não ter as condições de comprá-los, já que durante o dia trabalhava. Eis aqui um aluno “real” diferente do aluno “ideal” a que tantos professores sonham, aqueles que não fazem perguntas, que não questionam nada e que tudo está bom, conforme vemos em Baptista (2011, p. 32 e 33).
Enquanto estudante, Vital Brazil presenciou dois momentos históricos para o Brasil: a Libertação dos escravos e a Proclamação da República.
Embora tivessem muito respeito pelo imperador, os estudantes e professores eram contrários ao governo e favoráveis à república almejando maior participação democrática. O engajamento juvenil fez com que o jovem Vital tivesse seu momento histórico da vida nacional.

3.    O médico
Na ocasião em que fazia parte desse grande Batalhão Acadêmico, Vital tinha somente um pensamento, a defesa de sua tese para o curso de medicina.
Foi então que o fotógrafo, e amigo, adepto a homeopatia sugeriu-lhe estudar a planta pulméria, ideia que agradou Vital Brazil. Para tanto seria necessário um orientador pesquisador e, assim, Vital procurou pelo Dr Domingos José Freire, o único experimentador daquela época e que não se interessou pelo projeto de Vital Brazil. Cursada a tão sonhada medicina no Estado do Rio de Janeiro, Vital Brazil defendeu sua tese, cujo título foi “Funções do Baço” já em janeiro de 1892.

“Formou-se Vital Brazil Mineiro da Campanha, em dezembro de 1891, pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, fazendo jus ao título de "Doutor em ciências médico-cirúrgicas" (como consta de seu diploma assinado pelo Barão do Lavradio) pela defesa da tese "Funções do Baço", apresentada de forma manuscrita em 15 de dezembro de 1891 e defendida e aprovada em 9 de janeiro de 1892.”  (BRAZIL, 2000, P.10)

Logo após sua formatura retornou a São Paulo e casou-se com sua prima em segundo grau, Maria da Conceição Philipina de Magalhães, com quem teve oito filhos ficando viúvo em março de 1913.

4.    A importância Vital para o “Brazil”
No decorrer desse texto, pudemos tomar conhecimento da importância de Vital Brazil enquanto médico sanitarista.
Quando regressou a São Paulo foi contratado para o Serviço Sanitário do Estado, dali seguindo em comissões ao combate da febre amarela, malária, varíola, difteria e outras endemias pelo interior estabelecendo planos e promovendo o saneamento básico nos locais em que passava. Em 1895 ocorreu a epidemia cólera-morbo, uma doença infecciosa que causa cãibras, vômitos e dejeções. 
Vital Brazil nunca quis ser médico pelo status, mas pela missão de combater males que assolava a população, sobretudo as mais carentes e com isso não poupava esforços correndo todos os riscos de contaminação.
Sua esposa e sua mãe se preocupavam com sua constante exposição ao risco de contrair todos aqueles tipos de doenças, tanto que Vital contraiu a febre amarela - sim, porque cometemos um equívoco quando imaginamos que um médico sanitarista esteja imune a doenças-, e por conta disso Vital deixou o serviço público e decidiu dedicar-se à clínica médica em 1895.
Seguindo para a cidade de Botucatu onde decidiu trabalhar em prol de seus irmãos, Vital mostrou caráter quando não fez distinção de religião ao colocar sua profissão à frente do problema que coube a ele resolver.
Em uma cidade com a maioria protestante, inclusive ele, se viu diante da situação de um católico, bêbado e adúltero convicto mordido por uma cascavel havia três dias. Ao chegar à residência deparou-se com o campeiro de ressaca, “sobre a picada, escandalizava um feio emplastro tresandando a fumo mascado e pinga com arruda, breu e talo de bananeira. Tudo isso envolto pelas contas de rosário de carapiá.” Percebeu então que a cobra que o picara estava sem veneno, mas mesmo assim o medicou causando indignação aos que lhe acompanhavam pelo fato de não deixar que a mulher retirasse todo o aparato, já que ele era protestante e foi indagado se acreditava que tudo aquilo curava mordida de cobra.  Assim Vital conclui:

Não, não acredito que fumo, cachaça e rosário disto ou daquilo possam mais do que veneno de cascavel em corpo humano. Mas se a cobra picou anteontem e o homem na verdade só padece de forte ressaca, devo concluir que a cobra estava sem veneno no instante da mordida. Ele nem precisaria de tratos. Mas quis se tratar e nessa precisão pôs fé no emplastro e no rosário. Mostrou-se homem de expediente e de fé. Por enquanto, não tenho nem medicina nem ensinamento para substituir os recursos que ele tem e usa. O que não posso, como médico e homem religioso, é deixar uma criatura sem os remédios nos quais confia e retirar-lhe a fé na qual descansa. Ele está salvo e com fé robustecida. Que mais desejar para um homem? “A grandeza de um homem referencial bem pode ser revelada por um pequeno-grande episódio.” (da Revista da Academia Paulista de História - Ano XI - Nº 51 apud BRAZIL, 2000 p.12).

Vital tinha muito medo das serpentes e venceu a barreira do medo ao tomar conhecimento de um jovem ter morrido envenenado, foi então que resolveu se dedicar profundamente às pesquisas para encontrar a verdade e explicar o porquê de serem tão variadas as substâncias preconizadas contra o envenenamento. Para isso Vital tinha contato direto com as serpentes que lhes eram entregues em caixotes que ficavam nos fundos do laboratório, ali ele ficava horas a fio analisando o comportamento de cada uma.
Em 1897 foi nomeado a assistente do Instituto Bacteriológico, sob a direção do médico naturalista Adolfo Lutz de quem Vital Brazil obteve tanto a autorização para ocupar-se do ofidismo como seus conselhos. Sua dedicação chamou a atenção dos colegas a ponto de o incentivarem a perseverar na busca da verdade.
Dessa forma, Vital Brazil dedica-se com muito mais empenho e verifica a inatividade do soro de Calmette sobre o veneno da cascavel e da jararaca, duas espécies de serpentes nativas do Brasil, fato que o levou a imunizar, em laboratório, animais com os venenos dessas serpentes e pesquisar sua especificidade.
Nessa pesquisa pelejante, Vital, enfim, conseguiu com que a especificidade dos soros antipeçonhentos passasse a ser uma realidade científica.
Com essa conquista, Adolfo Lutz solicita ao Governo a criação de um instituto onde Vital Brazil pudesse prosseguir suas investigações, já que no Instituto Bacteriológico não havia espaço suficiente para a instalação do cativeiro das cobras, o que inviabilizava a fase final do trabalho: a produção do soro em grande escala.
Com o surto epidêmico ocorrido na cidade de Santos em 1899, Vital Brazil se viu a frente de mais um desafio: o de descobrir que tipo de surto era aquele e sua causa. De São Paulo, Adolfo Lutz acompanha os interesses e identifica a realidade de ser a peste, enquanto Vital Brazil isola-se em um quarto da Santa Casa de Santos para suas pesquisas e identifica a ipizootia de ratos.
A Vital é delegada a missão de tratar de um doente que dá entrada no isolamento em estado grave e ali se empenha na prova final do seu diagnóstico, mas dois dias depois começa a sentir os sintomas da moléstia. Oswaldo Cruz chega à cidade portuária com a missão de acompanhar os trabalhos e Vital relata os resultados obtidos até então e lhe confia o prosseguimento da pesquisa em que Oswaldo detecta ser, de fato, a peste e com satisfação dá o diagnostico à Vital Brazil: "Parabéns, Vital, você está com peste". Começou aí a amizade entre esses dois expoentes da medicina brasileira, cultivada nos anos que se seguiram pelo respeito e mútua admiração.

5.    Os institutos

5.1 Instituto Butantan (São Paulo)
Quem conhece o instituto e sua estrutura não imagina o que teve de percorrer para ser o que até hoje é, reconhecido internacionalmente pela sua produção e pelo centro de pesquisa que se tornou pelo esforço dedicado por Vital Brazil para que seu trabalho fosse válido, sem a preocupação de reconhecimento pessoal.
Nomes reconhecidos até hoje, como por exemplo, Oswaldo Cruz, Adolfo Lutz, Emílio Ribas, fizeram parte da trajetória e da luta de Vital para que fosse possível a concretização desse trabalho que já dura mais de 120 anos.
Vital Brazil entra na fazenda Butantan em 24 de dezembro de 1899, mas só em 1900 é que suas atividades são iniciadas.
Muitos foram os obstáculos para poder dar sequência ao seu trabalho, porém com sua experiência, argumentações e a prática em mostrar como se dava todo o processo, ganhava aliados e, mais do que isso, fazia amigos.
Na incumbência de organizar, instalar e dirigir um laboratório, a fim de produzir o soro antipestoso, Vital exulta a felicidade de poder mostrar sua bagagem que trazia sobre seu trabalho de ofidismo e poder aplicar em maior escala e em grandes animais, já que só trabalhava com animais de laboratório.
Como médico humanitário, não se preocupava somente com a produção do soro, que, haja vista, o tornara famoso, mas muito mais com a qualidade de vida das pessoas propensas a serem atingidas por bichos peçonhentos, sobretudo os homens do campo. Com isso Vital fez com que o soro fosse acessível, também, por essa humilde população.
Correto seria se ele agisse somente sobre o problema por se tratar de um médico. Correto? Não, se lembrarmos do fato de que Vital Brazil era o médico humanitário, como o próprio nome diz.
Vital Brazil tinha por hábito visitar enfermos das imediações antes de prosseguir para o Instituto Butantan, esse gesto foi reconhecido por um comerciante Italiano que escreveu na porta de seu comércio com letras enormes que podiam ser lidas a distância “Avenida Vital Brazil”, nome que foi mantido até hoje e é uma das mais importantes avenidas da zona oeste de São Paulo. (fonte: Instituto Vital Brazil).
Vital aproveitando-se da vivência com esses cidadãos ensinava-lhes as medidas de proteção contra acidentes com bichos peçonhentos através do uso de botas. Além disso, ensinava-lhes a importância de protegerem animais como o cangambá, a seriema e a muçurana – espécie de serpente inofensiva que se alimenta de serpentes venenosas- e com essas atitudes já utilizavam da prática ecologicamente correta, mantendo o equilíbrio da natureza e preservando as espécies.
Com essas medidas, Vital publica em 1911 o livro “Defesa contra o Ofidismo”, uma obra com grande valor didático e de linguagem muito simples para que fosse tangível para todos os públicos. Eis então mais uma preocupação de Vital: não escrever somente para um público de classe médica ou letrada, mas para quem, de fato, utilizaria suas técnicas. 
Com a publicação do livro, o Instituto tomou proporções internacionais e um local muito visitado por pessoas de alto nível cultural e de outras instituições. Entre elas: Emst Bresslau, Émile Brumpt, Marchoux, Theodoro Roosevelt, Santos Dumont, Rei Alberto da Bélgica, a Rainha Elizabeth, o Príncipe Leopoldo e Rui Barbosa. No livro de visitas datado de 06 de abril de 1914, Rui Barbosa deixou a seguinte mensagem:

É com sincero entusiasmo que exprimo a minha admiração para com esta casa, pelo que dela sei e acabo de ver. Felizes de nós, se a cultura geral do país e o progresso brasileiro estivessem à altura desta esplêndida instituição, honra do sábio que a dirige, dos homens de ciência que nela brilham, do povo que dela se desvanece e do governo que lhe tem compreendido o valor “( BRAZIL, 2000, p 18).


Em 1917 recebe a patente do soro antiofídico e sem titubear decide doá-la ao o governo brasileiro. Seu objetivo era a saúde pública e não a fama.
Mas, desde que o mundo é mundo, quem trabalha em prol do próximo, obtém sucesso e reconhecimento, causa inveja àqueles que nunca nada fizeram.
Vital Brazil desbravava outras áreas além da área da saúde, entre elas a da Educação. Projetou uma área dentro do Instituto destinada para um curso para o preparo de professores e diretores de grupos escolares em questões de saúde e higiene e na utilização da escola como elemento da educação sanitária. Foi então que em novembro de 1918, o jornal “O Estado de São Paulo” publicou a conclusão do curso em Higiene Pública Elementar pela primeira turma, constituída por diretores de escolas normais e grupos escolares, o que gerou tamanha inveja pelos que nada faziam, sim, aqueles que citamos pouco antes e que tentaram afastar Vital Brazil desse projeto, o que lhe causou grande desconforto e o objetivo dos invejosos atingidos: Vital Brazil se afasta do Instituto retornando somente quatro anos mais tarde.

5.2 Instituto Vital Brazil (Rio de Janeiro)

O Instituto Vital Brazil, situado em Niterói/RJ foi criado em 03 de junho de 1919. A princípio o nome dado foi “Instituto de Higiene, Soroterapia e Veterinária”, porém desde o primeiro dia de funcionamento os funcionários se recusaram a chamá-lo pelo nome oficial, dando ao instituto o nome de seu fundador, que permanece até hoje.
Vital Brazil decidiu se mudar para Niterói a convite de Raul de Morais Veiga, então presidente do Estado do Rio de Janeiro. Naquela época o instituto era localizado em Icaraí e fabricava produtos farmacêuticos, veterinários e biológicos (soros e vacinas). No entanto Vital Brazil baseava as atividades do Instituto não apenas em produção, mas também em pesquisa e formação.
Somente em 1920 o Instituto Vital Brazil teve início nas suas atividades na Olaria Santa Rosa, local onde se encontra até hoje. Nos arredores nasceu o bairro Vital Brazil e nesse mesmo ano Vital Brazil instala postos antiofídicos nas cidades próximas para que os interioranos tivessem fácil acesso à informação e à coleta de animais. Nesse mesmo ano Vital Brazil realiza seu segundo casamento após seis anos de viuvez com a Senhora Dinah Carneiro Viana com quem teve mais nove filhos.
Foi por meio do Instituto Vital Brazil que tivemos acesso à vacina BCG (contra tuberculose), descoberta por Albert Calmette e Camille Guérin na França e foi deles que Vital recebeu para seu laboratório o teste e ampolas.
Na década de 30 havia muitas mudanças políticas e prevenindo-se, Vital Brazil fez do instituto uma propriedade privada, porém mantendo vínculo com o Estado já que sua missão era trabalhar única e exclusivamente com a saúde pública. Logo no início o Instituto ofereceu bolsas de pesquisa a estudantes e desenvolveu uma biblioteca especializada.
Desde sua criação, o Instituto Vital Brazil passou por várias transformações em vários aspectos. Em 1943 foi reinaugurado pelo então presidente Getúlio Vargas, que investia de forma favorável as indústrias nacionais dirigidas por brasileiros e com isso o Instituto teve sua fase próspera, como também teve sua fase de crise financeira após a morte de Vital Brazil. Crise essa gerada pelas dívidas da reforma, pela falta de pagamento de empresas estatais - que eram os principais clientes da instituição- e com todos esses acontecimentos em 1957, o instituto voltou a ser majoritariamente do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Todo o processo de venda só foi concretizado após o Governo firmar compromisso de que a idealização feita por Vital Brazil fosse mantida, ou seja, o compromisso de manter a instituição um centro de pesquisa, formação e produção de soros, vacinas e remédios. O compromisso se cumpre até hoje.

6.    O compromisso com a educação
Todo ano são promovidos vários eventos destinados aos estudantes de todos os níveis, entre eles “Férias Científicas” com o objetivo de promover a divulgação científica para o público infantil, e um evento científico para alunos do Ensino Médio, denominado “I Encontro Científico Tecnológico para o Ensino Médio” que objetivou alunos e professores da área de Ciências da Natureza e Matemática terem contato com a pesquisa científica.
Outro projeto comprometido com essa classe e promovido pelo Instituto Vital Brazil é o “Projeto Leia”. Tal projeto tem o caráter social, cultural e educacional e o objetivo de contribuir para a formação do leitor com mudança de hábito, tanto em crianças como em adolescentes e adultos.
Com o apoio dos monitores acadêmicos de Licenciatura da Universidade Federal Fluminense (UFF), o projeto parte de dois pontos, um fixo no Instituto Vital Brazil e outro com a biblioteca itinerante que permanece por dois meses em cada cidade em torno do Instituto, onde os leitores tem acesso livre ao acervo, o que é considerado de suma importância.

7.    O final de uma história

Vital Brazil falece em sua residência no Rio de Janeiro na manhã de 8 de maio de 1950. Sua morte foi causada por uremia, forte concentração de ureia no sangue, e seu legado passará pelas mais atuais revisões dos livros de história, medicina e descobertas até hoje já constatadas.


Considerações Finais
Vital Brazil desde menino teve determinação para alcançar seu maior objetivo: Ser médico.
O apoio de seus pais para que esse sonho fosse possível foi de suma importância, uma vez que eles também não eram de classe social elitizada e o desmerecimento muitas vezes começa em casa, quando esses também consideram não ser possível formar um filho médico por não pertencer a tal classe.
            A opressão sofrida no início pelos que detinham o poder e consideravam nula a chance de quem não tivesse dinheiro formar-se médico, fez com que Vital buscasse com mais afinco por essa possibilidade, e é essa postura a considerada plausível e faz com que o oprimido seja respeitado.
A descoberta do soro antiofídico para Vital Brazil foi o acontecimento mais importante de sua carreira como médico. Contudo, fazer dessa descoberta o uso em prol de pessoas que corriam riscos constantes e não usar em benefício para enriquecimento próprio talvez tenha sido a chave para o seu sucesso e reconhecimento.  
Vital Brazil enxergava a medicina como meio de ajudar a classe mais necessitada da população brasileira. O que ele não imaginava era que com toda sua trajetória, por consequência, ajudou várias áreas, como por exemplo, o campo da pesquisa e assim, também, a educação.
No campo da Educação, valeu-se de seu “poder” no Instituto Butantan pleiteando a formação de professores e de gestores para que dessa forma pudessem aprimorar seus conhecimentos em suas áreas, conseguindo, assim, a interdisciplinaridade com a área de higiene e saúde, o que foi considerado muito importante para a época.
A conclusão que podemos chegar nesse trabalho, consiste em persistência para conseguir um objetivo sem responsabilizar a situação em que vive não se vitimando de tal situação e muito menos se aproveitando de uma condição em benefício próprio.
Quisera que em todas as áreas tivéssemos profissionais comprometidos não só com o que lhes dizem respeito na formação, mas que vão além, que vejam no outro a necessidade de poder saber mais e por consequência aprender mais.



Referências Bibliográficas

BAPTISTA, Ana Maria Haddad. Educação, ensino & literatura – propostas para reflexão. São Paulo: Arte-Livros Editora, 2011.
BRAZIL, Lael Vital. Vital Brazil: vida e obra 1865-1950. Niterói: Instituto Vital Brazil, 2001. 56p. (Discurso proferido na solenidade de comemoração do aniversário de 80 anos do Instituto Vital Brazil, 11 set. 2000).

_________________. Vital Brazil Mineiro da Campanha. Uma genealogia brasileira. Rio de Janeiro: 1996. Versão atualizada para biblioteca virtual em maio de 2002.
FREIRE, Paulo.  Pedagogia do Oprimido. Rio Janeiro: Paz e Terra Editora, 2010.

Referências Eletrônicas

www.butantan.gov.br  acesso em 20/07/2015.
www.vitalbrazil.rj.gov.br  acesso em 26/07/2015.



Texto publicado na Revista da Fundarte Edição nº31








[1]  “A hora da estrela” -  Romance de Clarice Lispector lançado em 1977.

[2] Vital era o nome do santo do dia e Brazil com “z” era como se escrevia na época de seu nascimento.

Comentários